O que saber sobre “Wonka”: o livro e as adaptações anteriores
Cinema | Acho Que Vais Gostar Disto
É já nesta quinta-feira, dia 7 de dezembro, que o João Dinis, o Miguel Magalhães e a Mariana Santos vão estar no Cinema City do Campo Pequeno, em Lisboa, para uma sessão especial ao vivo do Acho Que Vais Gostar Disto.
Na prática, isto significa que o trio vai estar na sessão das 18h45 para ver Timothée Chalamet no grande ecrã e depois vai gravar o episódio sobre "Wonka" - que estreia precisamente neste dia - nas instalações do Cinema City. Escusado será dizer que estão todos convidados a assistir ao filme e depois a participar na conversa. Podes saber todos os detalhes aqui ou através das nossas redes sociais em @vaisgostardisto (relembramos que há um desconto de 40% na compra de dois bilhetes nas bilheteiras físicas do Cinema City com o código AQVGD40).
Mas antes das gravações e de nos sentarmos na sala escura com um balde de pipocas, e já que a estreia de “Wonka” nos cinemas nacionais está muito próxima, aproveitamos a ocasião para recapitular a história de "Charlie e a Fábrica de Chocolate", descobrir as diferenças entre os filmes de 1971 e 2005 e perceber do que trata afinal esta prequela baseada no clássico infantil de Roald Dahl.
A história e o autor
Willy Wonka é uma personagem icónica da nossa cultura há décadas, sendo transversal a várias gerações e seguida por miúdos e graúdos desde os anos 60. Wonka surgiu pela primeira vez no livro infantil “Charlie e a Fábrica de Chocolate” (1964) e depois na sequela “Charlie e o Grande Elevador de Vidro” (1972), ambos da autoria de Roald Dahl, escritor galês de origem norueguesa, e um dos autores mais aclamados e vendidos do mundo.
Na história original (revisitada várias vezes para “atualizar” a linguagem e para mudar a origem dos Oompa-Loompas, que de pigmeus africanos passaram a habitantes da Loompalândia), Willy Wonka é-nos apresentado como o “maior” e mais “extraordinário” fabricante de chocolate do planeta, capaz de criar, além de centenas de tipos de chocolate deliciosos, um gelado que nunca derrete. Acontece, porém, que Wonka, apesar do estatuto de unicórnio do chocolate, tem tanto de génio como de misterioso — pouco se sabe sobre ele e do que se passa na sua fábrica, fechada há muitos anos, onde vive numa aparente reclusão.
Isto, até ao dia em que decidiu abrir um concurso e dar a oportunidade única a uma mão cheia de crianças ao sortear cinco Bilhetes Dourados, escondidos aleatoriamente nas suas tabletes de chocolate. Os contemplados vão ganhar uma visita guiada à fábrica, acompanhados por um adulto à sua escolha, e terão direito a todos os tipos de doces achocolatados com o selo Wonka — para o resto da sua vida. Para o jovem e guloso Charlie, este prémio não é nada menos do que uma espécie de Euromilhões com sabor e cheirinho a cacau.
Dahl, que segundo a biografia no site da Fundação com o seu nome foi também “um espião, piloto de caça, historiador do chocolate e inventor médico”, morreu em 1990, aos 74 anos, como um contador de histórias consagrado no mundo inteiro via 16 livros infantis que foram traduzidos em 68 línguas (mas cujo legado fica assombrado por declarações antissemitas, que levaram inclusive a família pedir desculpa mais tarde). Apesar de “Charlie e a Fábrica de Chocolate” ser o motivo que leva a estas linhas, o britânico escreveu, entre outros títulos conhecidos, “James e o Pêssego Gigante”, “Matilda” (adaptado recentemente como musical na Netflix), “The BFG” (que Spielberg realizou para a Disney) ou “O Fantástico Senhor Raposo” (em que Wes Anderson pegou e transformou num filme de animação com George Clooney a emprestar a voz ao mamífero de focinho pontiagudo e arrebitado).
O génio de Gene Wilder
O sucesso literário não demorou a transitar para o grande ecrã. E se Roald Dahl é o pai da personagem, Gene Wilder, que faleceu em 2016 aos 83 anos devido a complicações com a doença de Alzheimer, é o Willy Wonka de carne e osso de quem as pessoas se lembram — e é difícil de dissociar a personagem do ator na cultura popular (por muito que este gostasse que o seu legado fosse mais “Frankenstein Júnior”).
Em 1971, o realizador Mel Stuart adaptou o livro a partir do argumento do próprio Dahl, mas tomou algumas liberdades criativas que não agradaram ao escritor britânico. Aliás, é público que Dahl não ficou fã do produto final — o que não espanta, tendo em conta que queria outro comediante (Spike Milligan) a representar Willy, contrataram outra pessoa (David Seltzer) para reescrever o seu guião e alteraram o título da adaptação: de “Charlie & the Chocolate Factory” no livro, passou a “Willy Wonka & the Chocolate Factory” nos cinemas internacionais (existem várias teorias do porquê). Em Portugal, estreou com o título “A Maravilhosa História de Charlie”.
Sobre o filme em si, na altura, de forma geral, as críticas foram favoráveis ao musical. Roger Ebert, célebre crítico de cinema, por exemplo, considerou que o filme era “provavelmente o melhor filme do género desde O Feiticeiro de Oz”. Ainda assim, esta visão não é consensual pois houve quem considerasse que faltava à versão cinematográfica a magia achocolatada do material original (muito difícil de passar da página para um ecrã) e que se tratava de um filme familiar mais para a adultos do que para crianças (talvez em parte por causa do passeio de barco no Túnel do Terror no rio de chocolate).
No entanto, alheia à crítica e à opinião sobre as diferenças para com o tom da escrita original de Dahl, a realidade de hoje é que “A Maravilhosa História de Charlie” goza de estatuto de culto graças à performance de Gene Wilder, que apesar de só aparecer 40 minutos após o início do filme, interpretou o misterioso homem que castiga crianças mal comportadas com um magnetismo sinistro — que ficou para a história. Afinal, passados cinquenta anos, os versos “Come with me and you'll be / In a world of pure imagination”, que Wilder estava reticente em cantar por achar que não era cantor, continuam tão memoráveis como sempre o foram.
A vez de Johnny Depp
Quinze anos após a morte de Roald Dahl, em 2005, chegou ao cinema a versão de “Charlie e a Fábrica de Chocolate” de Tim Burton. Desta vez, com o nome correto e com o camaleónico Johnny Depp no papel de Willy Wonka, num filme que marcou nova colaboração entre o ator e o realizador.
O que difere o filme de 2005 e o de 1971? Bom, o primeiro não é um remake do antigo e é mais fiel ao livro. Na versão de Tim Burton, por exemplo, aprofunda-se mais a origem de Willy Wonka e os motivos pelo seu afeto tresloucado pelo chocolate e doces, as canções vêm diretamente do material de origem e as crianças e os seus defeitos estão mais próximas das descrições de Dahl. Também ficamos a conhecer um pouco mais sobre os famosos Oompa-Loompas e o avô de Charlie desempenha um papel mais preponderante. A par, a mensagem da importância “da família” é bem mais proeminente (no de 1971, o foco estava um pouco mais ligado ao comportamento errático das crianças).
Assim como o final é ligeiramente diferente. Wonka acaba por assentir que Charlie é um coração puro em ambas as versões, mas os acontecimentos nas últimas cenas mudam. A versão de 1971, mais aberta à interpretação do espectador, sugere que Charlie (interpretado por Peter Ostrum, que deixou a representação depois do filme para ser veterinário) chegou ao fim da visita guiada à fábrica imaculado por ser uma criança sem egoísmos, de origens humildes e moralmente correta (ao contrário das outras quatro que encontraram o Bilhete Dourado). Na de 2005, Charlie (o então pequenino Freddie Highmore deixou o estatuto de “Child Actor” e é agora um homem casado com mais de 100 episódios de “The Good Doctor” e 50 de “Bates Motel” no CV) volta a repetir o feito, mas desta vez Willy Wonka saiu também vencedor: reencontrou-se com o pai dentista e ganhou uma nova família.
Quanto aos protagonistas, o Wonka de Wilder é diferente do Wonka de Depp. E é um daqueles casos em que enquanto houver livre arbítrio e opiniões, estas vão sempre variar consoante a quem se pergunte. Além de toda a questão das diferentes gerações, há quem prefira o tom mais humorístico e desenvolvimento que Depp imprimiu na personagem à intensidade e ao tom meio assustador de Gene Wilder (ou vice-versa). No fundo, o clássico e o original continua a ser Wilder (que considerou a interpretação de Depp um insulto), mas há quem tenha um cantinho no coração reservado para Depp.
O Wonka de Chalamet
Até que chegamos ao presente e a 2023 — e há um novo filme de Wonka pronto a fazer mexer a máquina da bilheteira. Anunciado em 2018, depois de a Warner Bros. ter comprado os direitos do livro de Roald Dahl dois anos antes, “Wonka” chega finalmente aos cinemas após vários atrasos devido à pandemia. Ao leme do projeto está o britânico Paul King, realizador conhecido pelos dois filmes do urso Paddington (muito populares no Reino Unido - é preciso lembrar que o urso tomou chá com a Rainha Isabel II no Buckingham Palace).
Neste filme, recuamos aos anos pré-Charlie e pré-fábrica de chocolate. Ou seja, “Wonka” é uma prequela que nos leva às origens de um jovem Willy Wonka e nos revela como Wonka teve primeiro de enfrentar um poderoso Cartel do Chocolate antes de ostentar o estatuto de ícone cultural mundial e ser o Willy Wonka que todos conhecemos. “Wonka”, de resto, não é baseado em nenhum livro de Dahl, mas sim num argumento original de Paul King (que dividiu os créditos do guião com Simon Farnaby, comediante com quem já tinha co-escrito “Paddington 2” e que é também protagonista de várias sitcoms britânicas como “Horrible Histories” ou “Ghosts”).
A dar vida à personagem que dá nome ao filme está o quebra-corações Timothée Chalamet, ator de 27 anos, que, não fosse os adiamentos, tinha dois presumíveis blockbusters no bolso em 2023 (“Wonka” e “Duna: Parte 2”). Do que se pode ler sobre o primeiro nos textos com as primeiras críticas ao filme, as palavras não podiam ser mais elogiosas, visto que em muitos deles o desempenho de Chalamet é descrito através de adjetivos como “encantador”, “excecional” e “magnético”. Pelo visto, compensou não ter pedido conselhos a Johnny Depp e ter crescido a ver a versão de Gene Wilder (numa entrevista explica as diferenças entre o seu “Wonka” e os de 1971 e 2005).
No entanto, diga-se que Chalamet não é único a receber elogios num elenco de luxo, que inclui uma participação especial de Sally Hawkins (é a mãe de Willy), e os contributos de Olivia Colman, Rowan Atkinson (o eterno Mr. Bean) ou Jim Carter (o Mr. Carson de “Downton Abbey”). A magia e o CGI de Lofty, o Oompa-Loompa de Hugh Grant, também está a ser muito comentada e destacada.
Relativamente ao filme propriamente dito, as críticas também são francamente positivas, especialmente nos meios britânicos, que elogiam a “paddingtonização” do filme de Paul King. No The Guardian, Peter Bradshaw dá cinco estrelas e enfatiza que “Wonka” “fornece as endorfinas do chocolate” necessárias, e o The Telegraph escreve que como “qualquer bom chocolatier, King concentrou-se obsessivamente na textura e no sabor”. Mas como nem todo o mundo adora ou aprecia chocolate, do outro lado do Atlântico, o crítico do The Hollywood Reporter admite que os espectadores mais jovens até podem ficar impressionados com os visuais e coreografias, mas sentiu que o cacau servido não era dos melhores — e não saiu da sessão muito impressionado.