Vinte anos após o fenómeno "Cidade de Deus" ter redefinido o cinema brasileiro, a Max estreou esta semana "Cidade de Deus: A Luta Não Pára", um spin-off que nos leva de volta às ruas da icónica favela carioca. Com um salto temporal para 2004, a série equilibra-se entre honrar o legado do filme original e criar uma identidade própria. Apesar de não ser perfeita, esta nova incursão no universo de Buscapé promete cativar tanto os fãs nostálgicos como uma nova geração de espectadores, provando que na Cidade de Deus, a luta - e a história - realmente não param.
Quando estreou, no início do novo milénio, em 2002, o filme “Cidade de Deus” revelou ao mundo uma perspetiva inédita sobre a realidade das favelas do Rio de Janeiro. Baseado no livro de Paulo Lins, e realizado por Fernando Meirelles e Kátia Lund, o filme apresentou uma narrativa crua e visceral, guiada por Buscapé, o jovem apaixonado por fotografia que nos conduz através do labirinto de betão e violência onde cresceu. A frase “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come” tornou-se o lema de uma obra que, para além de conquistar uma enxurrada de prémios e várias nomeações para os Óscares, redefiniu o cinema brasileiro com o seu estilo inovador e frenético.
Agora, duas décadas depois, a Max resgata esta história com "Cidade de Deus: A Luta Não Pára", uma série que revisita e expande simultaneamente o universo do filme original. A narrativa transporta-nos de volta ao início dos anos 2000, mais concretamente a 2004, avançando 20 anos no tempo desde o período de 1960 a 1980 explorado no filme.
Pondo isto, a questão impõe-se: mudou algo na Cidade de Deus? A resposta é simultaneamente sim e não. O novo “manda-chuva” é Curió (interpretado por Marcos Palmeira, cara conhecida de novelas como "Irmãos Coragem"), que, apesar de traficante barão, é alguém afável com a comunidade e alguém que mantém uma certa ordem nas ruas — o que não significa que a violência, o BOPE e pobreza não sejam uma visão constante no bairro.
No meio deste ambiente, a série apresenta-nos novas personagens e histórias, enquanto recupera elementos nostálgicos do filme original, como as galinhas, as músicas de Gabriel o Pensador e a presença de Buscapé, que, agora mais velho e maduro, quer ser tratado por Wilson, o seu nome de nascimento. Rapidamente ficamos a saber duas coisas: que Buscapé não consegue virar Wilson e será sempre Buscapé, e que já não vive na favela, embora continue umbilicalmente ligado a ela. Primeiro, porque o seu editor não o deixa apontar a lente de fotojornalista para outra coisa que não seja crime ("é o que vende capa!"); segundo, porque continua a trabalhar no maior jornal da cidade, onde começou a carreira depois de ter fotografado o fim de Zé Pequeno, para ajudar a pagar as contas da mãe e da filha adolescente, que ainda residem na Cidade de Deus.
Quanto à série em si, é preciso deixar a ressalva: apesar de esteticamente parecida ao filme original para efeitos de sequela, Fernando Meirelles está ligado ao projeto somente enquanto produtor. Atrás das câmaras está o realizador Aly Muritiba, conhecido pelo seu trabalho em “Cangaço Novo”, que desde logo assumiu uma tarefa ingrata: honrar o legado do original ao mesmo tempo que tenta criar uma identidade distinta para a série. Não é uma tarefa fácil. Nem de contar (como se nota pelo guião apressado e algo confuso do primeiro episódio, que não é nada amigo de quem está agora a começar a entrar na saga), nem de fazer. Aliás, tanto não é que pode dizer-se até que esse é o problema de “Cidade de Deus: A Luta Não Pára”.
Ao tentar apelar a um novo tipo de audiência, mais jovem, e, ao mesmo tempo, aos fãs do filme, que cresceram com ele, acaba por nem oferecer algo totalmente diferente, nem conseguir replicar a essência e a magia da fórmula antiga. Continua a existir uma narrativa não-linear e ritmo frenético a espaços (embora sem a essência que imortalizou o original), mas mais como fan service do que como a melhor escolha narrativa. A crítica do The Hollywood Reporter vai mais longe ao notar ainda que o estilo Scorsese presente - narração a alertar para enredos que vão ser importantes mais à frente e flashbacks à “Goodfellas” para dar contexto das personagens - dá a sensação de que a série passa muito tempo a olhar para trás em vez de olhar para a frente.
Se tudo isto faz com que se deva de desistir ou nem passar por “Cidade de Deus: A Luta Não Pára”? Nada disso. Apesar de não estar ao nível do original, há todo um novo leque de personagens interessante para conhecer nesta sequela ao ritmo do samba da favela. Assim como é intrigante o suficiente para querermos saber o desfecho da guerra que se avizinha no bairro. Especialmente depois de Jerusa, a advogada e namorada de Bradock, líder do grupo Caixa Baixa durante a disputa entre Zé Pequeno, Piauí e Mané Galinha, desafiar a lei da bala imposta pelo manda-chuva Curió. Afinal, há muito que sabemos: “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”.
O primeiro episódio de “Cidade de Deus: A Luta Não Pára” já está disponível na Max. O segundo episódio estreia a 2 de setembro.
📚 Sugestões de leitura
A MadreMedia, responsável pelo clube de leitura É Desta Que Leio Isto e da marca Acho Que Vais Gostar Disto, tem disponibilizado no SAPO24 o primeiro capítulo ou outro excerto de livros recentemente publicados ou prestes a ser lançados. Nesta semana, a nossa sugestão de leitura destas pré-publicações é “Como Terminar Uma História de Amor”, romance de estreia de Yulin Kuang, argumentista e realizadora, mais conhecida pelos seus canais no YouTube (YulinisWorking e Shipwrecked Comedy).
Sinopse: Helen Zhang, uma escritora bestseller, foi convidada para colaborar na adaptação televisiva dos seus romances, em Hollywood. O que ela não contava era que fosse encontrar Grant Shepard, um antigo colega de escola, na sala de guionistas. Passaram treze anos desde o trágico acidente que ligou as suas vidas para sempre, mas Grant manteve-se exatamente como Helen se lembrava dele: engraçado, popular e adorável como ela nunca foi. E Helen também é exatamente como Grant recorda: brilhante, bonita e um pouco introvertida. O guionista sabe que não deveria ter aceitado o trabalho, mas a dedicação ao seu ofício falou mais alto, pois tem a certeza de que a participação na série inspirada no livro de Helen abrirá as portas certas, permitindo-lhe desenvolver os seus próprios projetos em Hollywood. O trabalho em conjunto começa por ser conflituoso e confuso, mas sem dúvida eletrizante, pois a atração não demora a falar mais alto. Quando todos os segredos são finalmente revelados, Helen e Grant têm de aceitar o facto de que a sua história nunca poderia acabar bem… ou será que não?
O excerto deste livro, nas livrarias a partir de 27 de agosto, pode ser lido AQUI.
🎞️ Na Internet, no mundo e na cultura pop
MEO Kalorama. Mais do que talento, os Massive Attack mostraram que o que conta é a intenção. O lendário conjunto de Bristol regressou a Portugal para um concerto concebido como um verdadeiro petardo ideológico para abalar conformismos e despertar consciências — e ajudou ter canções gigante para fazê-lo. Sam Smith fez também política à sua maneira pop, ao passo que Gossip lembrou-nos de um passado recente e Ana Lua Caiano de um futuro risonho. Assim foi o Dia 1.
Festival Eurovisão da Canção. Basileia vai ser palco da próxima edição, informou hoje a organização.
Angelina Jolie. Atriz passou “quase sete meses” a treinar para cantar ópera em “Maria”, biopic que volta a reunir o realizador Pablo Larraín e Steven Knight (o criador de “Peaky Blinders”) depois de “Spencer”. O filme conta a história dos últimos dias da Maria Callas, uma das maiores vozes de sempre do canto operático, em Paris, nos anos 1970.
O Corvo. Reboot com Bill Skarsgard fracassou na bilheteira nos EUA, depois de fazer apenas 4,6 milhões de dólares (custou 50 milhões de dólares) na sua estreia. E há uma pessoa que não está exatamente chateada com o assunto: Alex Proyas, o realizador do original, que tem defendido o legado de Brandon Lee (morreu durante a rodagem do filme original em 1993).
The White Lotus. Aubrey Plaza admitiu nesta entrevista que ainda não viu a série que lhe valeu uma nomeação para os Emmy porque não conseguiu… fazer o login na plataforma Max. E suspirou por um DVD.
Deadpool & Wolverine. Ryan Reynolds revelou uma nova cena de 20 segundos inédita, com o Gambit de Channing Tatum, que não aparece na versão final do filme.
Oasis. É oficial: irmãos Gallagher fizeram as pazes e regressam em 2025.
Happy Birthday, Marvel! Em 1939, a icónica empresa de banda desenhada foi criada por Martin Goodman ainda com o nome Timely Comics, antes de se tornar conhecida como Atlas Comics. Mas foi só 1961 que assumiu o nome pela qual a conhecemos atualmente, Marvel Comics. A marca começou com o nascimento do Quarteto Fantástico e de outros títulos icónicos criados por Stan Lee, Jack Kirby, Steve Ditko, entre outros. Esta quinta-feira, a Marvel celebrou os seus 85 anos com um video emotivo. Ora vê aqui.
🎥 Let’s look at the trailer
Séries
MONSTERS: The Lyle and Erik Menendez Story (Netflix, série true crime sobre a vida dos irmãos Menendez)
Nobody Wants This (Netflix, série com Kristen Bell e Adam Brody)
The Legend Of Vox Machina (Prime Video, T3)
Filmes
The Six Triple Eight (Netflix, de Tyler Perry, com Kerry Washington e Susan Sarandon)
Apartment 7A (Paramount+, prequela de “A Semente do Diabo”, de Roman Polanski, com Julia Garner, de “Ozark”)
Enviem as vossas sugestões para vaisgostardisto@madremedia.pt ou deixem nos comentários.