Acho Que Vais Gostar Disto: Porreiro, pá.
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Acho Que Vais Julgar Isto
O ano é 2015. Depois de vários meses numa cela em Évora, José Sócrates regressa a sua casa para ali ficar em domiciliária. Quem já esteve mais do que duas semanas fora de casa sabe o que terá José encontrado no seu regresso: plantas enrugadas suplicando por água, uma colónia de bichos-da-madeira banqueteando-se com o soalho, um frigorífico deserto com apenas um pacote de leite meio-gordo em decomposição. Depois de tomar um banho e de esventrar o colchão à procura de um possível microfone sob escuta, deitou-se em posição fetal e telefonou para o único número que qualquer pessoa que vive sozinha sabe de cor: o da Telepizza.
O resto da história já nós sabemos. Debaixo de um circo mediático de jornalistas, assistimos ao maior momento da nossa história televisiva, quando o estafeta chega à porta de Sócrates com uma caixa de pizza na mão, o capacete semi-enterrado na nuca e, satisfazendo a curiosidade da comunicação social, nos diz que os ingredientes são pepperoni e extra-queijo.
Fala-se muito do ator de método, aquele que encarna o personagem. Lembro-me logo de Christian Bale, que engordou vinte quilos por causa de um papel, submetendo-se a uma dieta rigorosa apenas à base de alheira de caça. Mas esquecemo-nos de que também quem escreve se entrega à história. É por isso mesmo que escrevo estas linhas enquanto espero por uma pizza. Os ingredientes? Pepperoni e extra-queijo.
Foi uma semana demasiado intensa a acompanhar a Operação Marquês para me conseguir abster dela. Interferiu comigo. Liguei várias vezes ao meu primo a pedir “daquilo que eu gosto”. Procurei mestrados em Paris. Perguntei ao motorista de um Uber se tinha envelopes para mim. Cheguei a ir para uma esplanada beber cerveja à espera que aparecesse uma jornalista da CMTV.
Nem aqui neste nosso cantinho consigo evitar, perdoem-me. Hoje as minhas recomendações vão ao tribunal de primeira instância. Hoje o meu gosto pessoal está sob escuta. Hoje sou réu da cultura pop. Acho Que Não Vais Julgar Isto.
E SE OS PROTAGONISTAS DA OPERAÇÃO MARQUÊS FOSSEM FILMES/SÉRIES?
José Sócrates | A invenção da mentira (Netflix)
A mentira não existe: é esta a premissa do universo paralelo criado por Ricky Gervais, onde o protagonista descobre que não dizer a verdade compensa. É assim que também imagino um filme biográfico sobre José Sócrates, lá para 2037, interpretado por um Rogério Samora que nessa altura já terá a nuca coberta por um bonito grisalho. Enquanto a RTP Play não pega nesse guião, esta comédia de desencontros sobre a verdade é um bom saco de boxe para descarregar as frustrações do sistema judicial português.
Carlos Santos Silva | Isto é um Assalto: O Maior Roubo de Arte do Mundo (Netflix)
“O que é feito destas obras de arte?”, pergunta-nos a nova série da Netflix. Foi assim também que esta semana José Alberto Carvalho confrontou José Sócrates a propósito de três obras de arte no valor de duzentos mil euros que desapareceram de sua casa. A série conta-nos uma história real. Corria 1990, um ano rico em obras de arte (segundo a minha mãe), quando dois homens se aproveitaram do truque mais usado em ficção para cometer um assalto: vestiram-se de polícias. Já procuraram os quadros na casa do primo de um dos assaltantes?
Ricardo Salgado | Apanha-me se puderes (Netflix)
É um clássico que está em todas as listas dos melhores filmes de sempre, assim como Ricardo Salgado é também uma presença habitual nas listas de arguidos em processos de corrupção. Neste filme, que é também uma história real, Frank foge de um agente do FBI camuflando-se de várias profissões e diverte-se com a própria fuga. Nem de propósito, o filme foi inclusivamente nomeado para um Óscar de Melhor Ator Secundário, papel esse que também Ricardo Salgado tem neste processo: é aquele ator discreto, mas fundamental na contra-cena, que dá tudo o que tem para que no final fiquem todos a ganhar.
Juiz Ivo Rosa | Liga da Justiça de Zack Snyder (HBO)
Ivo Rosa nunca foi a primeira opção do Ministério Público para julgar este processo, que sempre preferiu entregá-lo a Carlos Alexandre. Tem isso em comum com a DC Comics, tantas vezes relegada para segundo plano no universo dos super-heróis para a Marvel. É precisamente a DC que nos traz este "Liga da Justiça de Zack Snyder", onde Bruce Wayne, uma espécie de Ivo Rosa de Gotham City, nos aparece mais uma vez como o rei dos bons que nos vai salvar dos maus. A fórmula não é nova, mas funciona. O filme tem quatro horas e, tal como a Operação Marquês, a certa altura parece que nunca mais chega ao fim.
Juiz Carlos Alexandre | First Man (Netflix)
Carlos Alexandre foi o juiz que agarrou o processo antes de Ivo Rosa. Haverá melhor filme que este (injustamente mal amado) "First Man", sobre Neil Armstrong, o primeiro homem na lua, para representar o primeiro homem deste processo? Na verdade, uma vez que não chegou ao fim do processo, Carlos Alexandre será antes Michael Collins, o colega de Armstrong que foi com ele à lua mas que ficou na nave a fazer sandes.
Motorista João Perna | Comedians in Cars Getting Coffee (Netflix)
Dos mesmos criadores de “Comediantes Em Carros Vão Buscar Café”, aguardamos o tão ansiado “Políticos Em Carros Vão Buscar Dinheiro”. Enquanto isso não acontece, nesta série de entrevistas é Seinfeld quem faz de João Perna. O humorista, que aqui é o motorista de serviço, vai buscar os seus amigos, não para lhes entregar dinheiro, mas antes para os levar a tomar uma bica. Em vez de Sócrates e Santos Silva, no lugar do pendura vão Dave Chappelle, John Oliver ou até Barack Obama.
São estas as minhas sugestões para quem, como eu, está na ressaca da Operação Marquês. Espero que gostem. Eu cá até acho que ficou… porreiro, pá.
Guilherme Geirinhas
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